quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

As praias de Agnés

As praias de Agnés é um dos mais belos documentários a que já assisti. E ao dizer isso logo penso que não me expressei bem. Poderia dizer, sem titubear::: um dos mais belos filmes. E ainda assim, falta-me a palavra exata, porque As praias são um exercício de dizer de si própria na forma de um ensaio visual. Em vez da escrita, a imagem. E que imagens? A da vida da cineasta Agnés Varda, que assina o filme. E a vida, aqui, está de tal modo entrelaçada com o fazer artístico que é impossível não se apaixonar por essa senhora tão cheia de fantasias. E mais ainda::: é impossível não desejar uma vida com tantas experiências-acontecimentos. A sua expansividade, a sua paixão, a sua intensidade pertencem a um mundo que me parece cada vez mais inabitado. E ao dizer isso logo penso que não me expressei bem. Talvez tenha sido sempre assim. Os artistas, os verdadeiramente tomados por uma força criativa e criadora, são quem vive da forma mais inteira possível, desligados do comezinho da vida.

Posso estar sendo idealista, mas é o que o filme da Agnés me suscitou. Ao tratar de tempo e memória, como toda autobiografia, ela me fez lembrar de outro autor-personagem, muito mais do que de seus colegas da Nouvelle Vague. Lembrei de Federico Fellini. Não especificamente dele, mas das personagens de seus filmes, aqueles loucos cheio de esperanças, apesar das dores. Nada é totalmente estranho ao discurso autobiográfico, mas o que emana daí é uma alegria genuína diante daquilo que escapa desse discurso. Diferentemente do que normalmente acontece, não vemos apenas os fatos "marcantes" de sua vida. Aquilo que, inicialmente, não lhe diria respeito muitas vezes toma conta da tela, e justo essa "colagem", esse "inesperado" se transforma, bem diante de nós, numa cena inesquecível que diz respeito ao outro, e não a ela mesma, a autobiografada. Assim, o outro é o protagonista deste documentário que, filmado em 2008, é uma espécie de testamento de uma vida dedicada à arte. Um testamento que é também testemunho.
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Tudo essa declaração apaixonada para anunciar que estou empenhada em voltar a assistir filmes com a constância desejada - que o diga Cildo, documentário de Gustavo Moura, que vi sábado assim que acordei, com o Poeminha transitando para lá e para cá, como se também tivesse adorando o filme. Queria muito escrever sobre A ilha de Bergman, documentário de Marie Nyrerod, para relembrar aos meus três ou quatro leitores o quanto sou apaixonada pelo cinema desse cineasta. Ou escrever sobre Bob Dylan - Dont look back, de D. A. Pennebaker. Mas deixa pra outra hora::: que as horas sejam minhas amigas, é o meu desejo.  
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