quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Ainda May B

may b demora a sair de mim. talvez por isso vasculhe a net à cata de. encontrei belas fotos do fotógrafo olivier rickebusch. os fantasmas no meio do deserto. e também palavras de maguy marin.
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"Arriver à déceler ces gestes minuscules ou grandioses, de multitudes de vies à peine perceptibles, banales, où l'attente et l'immobilité "pas tout à fait" immobile laissent un vide, un rien immense, une plage de silences pleins d'hésitations. Quand les personnages de Beckett n'aspirent qu'à l'immobilité, ils ne peuvent s'empêcher de bouger, peu ou beaucoup, mais ils bougent".
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é isto mesmo. a imobilidade total é apenas miragem. "pouco ou muito, ... eles mexem". o "nada imenso" de beckett é insuportável. mas como disse rimbaud, "o insuportável é que não há nada insuportável".



sexta-feira, 21 de novembro de 2008

à memória de may b


(para quem quiser situar o que me parece insituável, eu aconselho a ler antes o post anterior, que está logo aí embaixo)

meu amigo me deixou ali sem esconder o espanto ao saber que eu ia ao subúrbio de paris para assistir a um espetáculo de dança. achava um absurdo tanto tempo despendido. mesmo assim saiu gritando para eu não esquecer a chave. era imprescindível usar a chave. para mim, imprescindível ver o espetáculo. era may b, de maguy marin, inspirado em beckett. de tudo que vi no ano beckett em paris, foi este espetáculo que quebrou as minhas pernas. todo mundo sabe que eu sinto dores quando algo me arrebata. e ainda assim posso dizer que com may b o arrebatamento foi inominável, para usar uma palavra do vocabulário de beckett. não foi a mesma angústia que senti ao assistir a bandonéon, de pina bausch, causada em grande parte pela tristeza infinda daqueles dias. em may b, foi uma angústia de quem se sentiu lado a lado de beckett, como se eu tivesse me transportado para um mundo insuportável. foi a leitora de beckett que foi ao inferno naquele teatro. todas as personagens dançaram sobre mim. aqueles seres sonâmbulos, enfileirados, arrastando seus pés, naquele lugar sombrio, fechado, claustrofóbico, atingiu não apenas a mim. éramos todos fantasmas habitando o mesmo espaço. eu me arrastei como eles. e diante do pére lachaise, duas horas depois de findo o espetáculo, embora soubesse que ele me esperava, sentei para olhar os corvos. e olhando os corvos o mundo todo se fechou sobre mim. eu era ali uma alma penada perdida na noite de poucas luzes. muito tempo depois, girei a chave na fechadura. eu nunca tinha tido a chave da casa de alguém que me esperava. e que me esperava com uma certa imagem – a de quem sorria com a espontaneidade desejada. logo naquela noite em que eu era tudo, menos a vitrine que eu tinha cuidadosamente construído para ser eu. eu não podia, naquele momento, ser a vitrine. eu me pressentia como uma grande víscera exposta de onde se podia ver cada putrefação. e mesmo assim eu girei a chave. ele não me disse nada quando me viu. sentou ali ao meu lado até beckett ir embora, envolvendo-me em um silêncio cheio de palavras. depois serviu o jantar. havia vinho sobre a mesa. e música na vitrola. muito tempo depois ele me disse que aquele choro que não compreendeu era a mais bela tradução de minha pessoa. e que tinha aprendido naquela noite a traduzir um estrangeiro sem o estereótipo. até hoje o verbo traduire me espanta. o que ele diz de mim e daquelas vísceras expostas? talvez por isso eu guarde em mim aquela noite como um dom. eu a chamo noite may b. e assim, carregada de memória, desta memória que nos tatua, assisti a umwelt, também de maguy marin, no SESC pinheiros, na véspera do meu aniversário. e talvez por não ter mais a chave, que deixei lá em uma manhã de frio quando fechei para sempre as cortinas de tecido cru, enlouqueci um pouco no decorrer da noite, de uma loucura feliz. havia fantasmas demais em mim. mas eles dançavam - uma dança louca.
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May B em 28 de janeiro de 2007


Finis
C'est finis
C'est peut-être finis
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May B. Fui às lágrimas. A francesa ao lado também soluçava. Antes, lia um livro de Dosto. May B é Beckett em movimento. É terrível ver a dor a descrença o abjeto o horror o mutilado o não o sim a espera o corpo a miséria a torpeza o aleijão o pior dos mundos [o de dentro de nós] o medo a dúvida a angústia a solidão o luto o escárnio o sexo mecânico [há algum que não?] o obscuro o absurdo o estranho a memória o estrangulamento a desordem a repetição o peso o emparedamento - em movimento. Grutas Cavernas Buracos. Hesitação. Peut-être. Talvez. Quem pode nos salvar da humanidade que há em cada um de nós? Alguém pode nos salvar do efêmero do transitório do absurdo dos desejos dos medos? A salvação é uma mera formalidade. Perder-se é tudo na obra de Beckett. Os dez dançarinos gemem grunem arrastam seus pés deixando uma nuvem branca que pouco a pouco toma conta do palco: e soltam seus vermes seus espasmos seus gemidos - defecam - na hesitação disto que é a literatura no seu mais alto sentido; na dança no seu mais alto espanto. Perplexidade. Dúvida. Haverá algum dia um dia? Não se pode morrer sem ler Esperando Godot; Fim de partida; Molloy; O inominável; porque são nestes livros que se aprende a morrer a cada dia; e a viver sem que a vida seja ela mesma uma vida de ameba. A imobilidade de Beckett - seu absurdo riso - pesa sempre sobre mim a me mostrar o abismo profundo. Não há nenhuma terra prometida. E quem precisa dela, se só nos resta a solidão quando os outros dormem o sono dos justos. A justeza e a justiça são tão vazias. A luz diminui. Apaga. O homem fica só no meio do palco. Hora de parar de chorar. Todos aplaudem por mais de dez minutos.
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* May B, da coreógrafa Maguy Marin, foi concebido em 1981, e já atravessou meio mundo em mais de 500 apresentações. Estava na programação do Festival Beckett, organizado por Peter Brook, em diversos espaços e linguagens, aqui em Paris.
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* Vi no Teatro Jean Villar, em Vitry-sur-seine, às 16h. Difícil chegar lá. Prazerosa a busca.
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segunda-feira, 17 de novembro de 2008

zeca baleiro... e o que digo quando o escuto

um músico que nunca deixa de tocar na vitrola daqui de casa é o zeca baleiro. agora que voltei a morar sozinha, ele deve atrapalhar um bocado os ouvidos dos vizinhos. pois zeca baleiro pede música alta, pede balanço no corpo, pede sorriso maroto. e pede dançar agarradinho rindo das dores de amor. pede para se danar. desde o primeiro cd zeca transa esta coisa que chamam de “brega” com muita irreverência e humor. ele colhe o bom sentido deste brega e faz uma zoeira danada com suas "trombetas distorcidas e harpas envenenadas". para mim, por onde andará stephen fry e vô imbolá trazem uma macumbapopeletrônica difícil de ser igualada a qualquer outro cd seu, mas eu gosto disto. ele não seguiu um caminho já dado. virou outra coisa sem perder a invenção. sempre com muito estilo, muita inovação. foi assim em líricas. cd pra lá de conceitual. tem uma música lá que é toda minha história com alguém muito lindo. e totalmente alheio. muitas vezes eu deixei em suspenso a pergunta de qual era "a parte da sua estrada no meu caminho". o tempo se encarregou de dizer qual era, mas o "quase nada" - que foi muito - ficou para sempre. assim como ficaram os versos de "brigitte bardot"::: "a saudade/ é um trem de metrô subterrâneo escuro/ escuro claro/ é um trem de metrô/ a saudade é prego parafuso/ quanto mais aperta/ tanto mais dificil arrancar". foi muito depois que eu entendi o que era isto. foi no último metrô. então minha história se confunde nas músicas de zeca. agora ouço este "lado z". e é muito, muito divertido. tem a ver com meu atual momento: de muita alegria. e é o lado z mesmo: tem odair josé, tem moreira da silva, tem martinho da vila. tem tom zé. tem joão do vale. tem sérgio sampaio. tem a voz rasgada do zeca. levei para os meus alunos ouvirem. e saiu cada comentário. dá vontade de beijar na boca. dá vontade de se matar. de dançar agarradinho. cruzes de amar assim. e muita risada. porque dar risada é imprescindível. é o elixir. a tosse vai embora. a garganta arranha. responsa mostrar este avesso aos alunos.

e isso porque nem falei de ode descontínua e remota para flauta e oboé, cd onde ele musicou poemas de hilda hist e entregou às vozes de grandes musas da música. eu me embrulhei toda nesta entrega de ariana a dionísio. eu quero amar assim. eu quero que alguém venha aqui e me faça calar. e me deixe falar. e não me peça licença. ou não venha para que tudo vire poesia. ou que venha e ponha esta música para mim. e transforme a casa em cinema. e me olhe com desdém, com humor e com paixão. e não se intimide com meu espírito de colecionadora e me mostre que tem muito ainda que não vi nem tenho nem sei. eu não vou rastejar por esta pessoa. porque não sei rastejar. vou ser altiva como ariana. mas vou me entregar como ariana. só peço para não ter medo de mim. eu não meto medo. eu sou uma senhora com alma de menina. eu só quero alguém que me faça rir. que me deixe ir. que vá comigo. que me leve a esquecer a insônia. e me faça perder o sono. é tudo que posso ser. ser para o outro. sem promessas. sem salvo-conduto. pára-quedas que não abre. ou abre no último segundo. juro, como ariana, que sou inteira. que me divido, mas inteira me entrego. eu não me basto. nem o outro me basta. mas dois se bastam. dois sentem melhor o sol que está para nascer. fico com vontade de dizer estes desvarios ouvindo estas odes. fico aqui, então. na vitrola.

pois zeca. é melhor ouvir. na sua música, "deus brinca de gangorra no playground".

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Nosferatu - os dois filmes


Ontem, menos um buraco no meu amor pelos filmes. Menos dois buracos. Assisti aos dois Nosferatus. Eu já tinha tentado ver o clássico de F. W. Murnau em uma retrospectiva do expressionismo alemão que houve na Cinemateca Francesa quando eu estava em Paris. Um problema no metrô me fez chegar atrasada meia hora. Clássico é clássico. Uma enciclopédia o constitui. O imaginário está formado. A emoção é ao mesmo tempo saber. Não tem comparação. E me resta concluir o que muitos ja concluíram: é sublime. Porém, Nosferatu, o vampiro da noite, de Werner Herzog, me tocou muito mais. Talvez seja esquisito falar isto de um remake. No filme de Murnau, a beleza do preto e branco é uma aula de cinema (é uma escola, é o próprio expressionismo alemão), mas Herzog, a meu ver, conseguiu algo magnífico: vemos o mesmo preto e branco em seu filme em cor! Vemos a mesma luz difusa recaindo sobre as personagens para destacar suas expressões, seus gestos, seus pavores. Tal e qual! E que vampiro triste! E o terror, neste filme de terror, é esta tristeza expressa em cada gesto do corpo do ator Klaus Kinski; é através de seu corpo alquebrado, de seu rosto atormentado, de sua loucura - inveja e despeito, superioridade e inferioridade, amor e ódio -, que sentimos em toda a dimensão o horror da imortalidade. O horror de não ser humano. E Isabelle Adjani, como Lucy, lânguida, belíssima, quase um fantasma, entregue literalmente aos dentes do vampiro Nosferatu, é uma das cenas mais bonitas que já vi. Há muito de horror, de gozo, de fé, de loucura, de fascínio, de entrega, no sacrifício. E se o sacrifício da "pessoa pura" é muito mais enfatizado no filme de Herzog é justamente para nos provar isto.

terça-feira, 11 de novembro de 2008

no mato


o ser humano tem a mesma natureza
vê tanta beleza
e abre o coração
a regra diz pra comer na mesa
mas gostoso com certeza
é comer na mão
(chico césar)
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eu tenho aprendido muito. pensei assim ollhando as estrelas lá no mato. este tipo de pensamento vem fácil olhando as estrelas. sentindo o barulho do rio lá embaixo. ou dentro do rio rindo que nem criança que não teve infância e de repente se lembra de uma fresta daquele tempo. havia uma menina triste em mim. e outra sorridente. e outra amorosa. quero crer. quero crer em muito. uma lágrima caiu. mas eu a coloquei para dentro. nunca faço isso de colocar lágrima para dentro. mas fiz porque achei que estava chorando por engano. eu queria mesmo era sorrir. e crer naquele momento. ali no rio. ali na beira do rio. ali dentro do rio. ali na barraca que comprei por outra razão. mas que de repente comecei a achar que ela foi comprada para aquele instante. se o instante só existe quando existe emoção. que ela se armou por milagre. e que é um milagre a vida de todo dia. esta tecitura. este amarrar de nós. bem fortes para não desamarrar. talvez isto seja de fato desaprender. isso de sentir o barulho dos sapos e se sentir como se fosse um. uma sapa. um sapo. dois sapos. um coaxar que não assusta. ou assusta só um pouco. dois tatus. isso de sentir a areia. não areia fina. cascalho que arranha as costas. e fazer figa para que arranhe bem muito. para que deixe marcas. e que sejam todas bonitas. como o dinossauro que vi nas nuvens. como o pingo grosso que nos molhou. como a barrigada que dei porque nada sei de mergulho. suculenta e saborosa como a carne que comemos como bárbaros. longe dos pratos. com os dedos afundados na gordura. isso de desaprender tem sua beleza. pensei errado então. assim como chorei errado. eu agora desaprendo.

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

26 de outubro: abertura da bienal de São Paulo

Sendo mais Duchamp do que Leonardo da Vinci, museu D’orsay do que Louvre, mais Ernesto Netto do que Beatriz Milhazes, nada mais apropriado do que ir a Bienal no dia do aniversário. Ou isto ou não ir mais. Dia seguinte, voltar para casa. Tarde perambulando sozinha. Paredes do estômago se encontrando. Ânsia aqui e acolá. Ressaca dos diabos. Uma bienal feita não para meu gosto “avançadinho”, mas para meu estômago bebedor de coca-cola e cerveja. A Bienal do vazio. Uma aposta radical derivada dos tempos de crise. Uma aposta crítica::: combater a idéia de Bienal dentro da própria Bienal. Nada daquele frenesi, daquele amontoado de obras. O entulho engolido. O segundo pavilhão inteiro ao nosso dispor. Sentar. Deitar. Checar a máquina. Olhar o menino que corre. Desejar. Lembrar. Morrer um pouco. Observar aquelas curvas. Sentir a falta das paredes. O projeto moderno faliu de vez? Mas o vazio já não era uma proposta moderna? A arte acabou. Viva a arte. O vazio cheio de sentidos. Os parques de diversão entregues ao alarido do silêncio. Vem um homem e os fotografa mundo afora. Fácil? Fácil. Porém, corajoso. Não que a Bienal mostre o que seja a arte “hoje”. Ela escolheu um braço, abriu um hiato e tornou tudo intimista, pessoal, subjetivo, confessional, monocromático como os suportes de madeira que sustentam os poucos artistas escolhidos para expor no terceiro pavilhão. Uma arte da confissão. Os corpos dos artistas – em suas variadas poses - dispostos à nossa posse, ao nosso corpo de voyeurs. “A visão da pintura ocidental” é já reprodução nas paredes da Bienal. Reprodução e trabalho crítico: Fernando Bryce cataloga o desvario do outro. É impressionante. Também impressiona a outra série de quadros quase escondida pela “foule” que forma filas para descer o tobogã de Carsten Holle – o único trabalho realmente bizarro de toda a Bienal – que a excede, corrompendo as paredes do prédio até o lado de fora. Na série de quadros, dispostos em ordem alfabética, os caracteres do romance O estrangeiro, de Camus. Não bastam as reproduções, ainda me vem esta paisagem branca dos quadros de Vibeke Tandberg: ainda é o romance de Camus? Ainda é arte? Meu estômago bebedor amaldiçôa a multidão que mal repara no soco de estômago destes quadros. Amaldiçoa-os a continuarem descendo o tobogã, se isso lhes dá prazer. Talvez por isto o estômago bebedor fugiu das “obras participativas” e se perdeu por mais de uma hora vendo as gravuras de Leya Mira Brander: na convulsão de imagens e frases repetitivas, um mundo de delicadeza. Sentimentos em miniatura. Eu me embrulho toda. Paro. Recomeço. Fecho os olhos. Sinto medo. E uma ternura imensa. Depois tento ler o diário de Sophie Calle. Malditas aulinhas de inglês que me servem malemale. Tento decifrar a sua obsessão autobiográfica que já tinha me fascinado no Museu de Arte Moderna do Pompidou. Por instantes, penduro minha alma no varal. Vem o vento e a leva junto com o varal. Saio correndo enquanto alguém me olha com ternura. Quando foi mesmo? No caminho, encontro o tapete voador, que está lá na Bienal; é só olhar para cima. Por isso, paro. Ardo. Choro. E dou meia volta. Quem for, não esqueça de levar a chave. Qualquer chave. Entre na fila e troque pela da Bienal. Com ela, pode-se entrar a qualquer hora. Mas não acredite simplesmente.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Junio Barreto, pernambucano

ontem acordei de susto
do ronco da minha barriga com fome
bem quando sonhava
que estava jantando
com alguns amigos bons
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quase trôpegas. ou ainda não. e ainda com entrada vip (era niver, o moço acreditou logo, porque eu sou assim: dia de niver fica escrito na testa: "é hoje o dia"). assim vimos junio barreto fazer as honras do studio sp. junio barreto é um músico muito atípico. é um pernambucano atípico. não no sotaque, que é igualzinho a de todo pernambucano. mas no modo como traz de lá a sua música. eu queria dizer que ele é o joão gilberto pernambucano. será que pode? tá bom. já disse. ele tem um cd independente com uma capa muitíssimo estranha. coisa caseira. tem nem nome dele. sei não. é bom. e como joão gilberto, eu tive que ouvir mais de uma vez para gostar. mas cada vez que ouço esta bizarrice, mais gosto. ai - este arrastar de voz. esta língua. é bom. muito bom. sambinha devagarzinho com sotaque. arrastando também as batidinhas eletrônicas. dá preguiça, muita preguiça. e vontade de dançar malemolenga. me disseram que eu tirei o chapéu para ele e o saudei à moda japonesa exagerando enormemente. e lhe disse que já conhecia o seu cd e já tinha ido ao show dele e que gostava demais, sabe? pago um mico deste e ainda pago o mico de esquecer. tadinha. importante é esta sonzeirazinha, coisinha de nada. desimportante, das desimportâncias próprias da arte. amém, mãinha.


afro-reggae. eles já bastariam. uma sonzeira coletiva linda de ver e ouvir, incrivelmente boa de dançar. mas como entendem bem do fazer junto, ainda trouxeram vários convidados. resultado? muito suor.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

a moça de chapéu vermelho clicada no museu pela amigamari
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fazer planos é a maior besteira. dá sempre merda. até uma gripe filhadaputa acompanhada de uma inflamação na garganta me faz lembrar que o simples ato de engolir pode ser bem doloroso. e dor é soberana. instala-se e expulsa tudo. pois a vida dói. às vezes dói como dói esta garganta inflamada. e eu com tanto a fazer, as melhores intenções do mundo, multirão de leitura e de textos a corrigir, mal consigo levantar a cabeça, pernas doem, a tendinite fica aguda, a cabeça vira uma esponja e toda a água do mundo resolve se alojar na minha boca me fazendo cuspir a todo minuto como uma velha mascadeira. e eu fico três dias atrás de uma misericórdia divina ou farmacêutica ou de benzedeira, qualquer coisa que o valha, quando deveria estar atrás do que tenho mais que fazer. é foda, nãosuportoestafraquezanocorpo, talvez por isso acordei no meio da noite choramingando - sem saber se com frio ou com calor, na dúvida liguei o ventilador e me embrulhei com o edredon que veio junto com minhas coisas que estavam no naufrágio e segurei na mão. mas tudo isto foi depois do bolo de aniversário. teve bolo de verdade, com cobertura em cima. para mim e para o lobão. bolo e vinho e vinho. e eles. esta moça kotz não é de brincadeira. nem este moço ney.

agora o nascer do sol. ele me dá agua. e me faz chá. e bagunça a casa sem nenhuma cerimônia instalando som e fazendo virar cinema. e fica doente como eu. mas tem mais humor. e quando melhoramos um pouco, assistimos a uns filminhos, que é tudo que se pode fazer quando o corpo está neste estado de degradação. e eles vêm. a turma toda. e os beatles amolecem nosso coração e enternecem nossa alma e ficamos achando que a vida é bonita. quem pode imaginar uma moribunda? aposto que a rô achou que era invenção.

aí o primeiro dia veio, hoje. quando a campainha toca às 8h30 da manhã e um corpo neste estado precisa se levantar, coitado de quem a fez soar. mas é um portador. tem nas mãos um pequeno pacote onde reconheço de imediato a letra do meu anjo ruivo. tremo antes mesmo de abrir, envolta em emoção antecipada. dentro dele todo o nosso afeto. não são as coisas que me emocionam. é reconhecer nelas as nossas conversas. é me reconhecer nelas. é saber que a ruiva as escolheu porque presta atenção em mim, porque sabe o que amo. e eu a sinto inteira aqui. ela está deitada na rede vermelha. eu estou sentada no chão ao seu lado. até que ela me diz algo e eu agarro o seu pescoço e ficamos por ali enternecidas de amor.

então a tv acende. el greco começa. e eu vejo os muros de toledo. eu me vejo na cidade. me vejo vendo as suas muralhas. me lembro da promessa que fiz por lá. me lembro do acidente que quase provoquei. me lembro do conde d'orgaz. lembrar é o céu e o inferno. mas é o céu que toco agora. e depois leio as cinco notas sobre a obra de louise bourgeois. ai ai ai.

agora o dia pode começar. o corpo mareado está carregado também de amor. vou ligar o automático e fazer o que tem de ser feito. vou começar indo ali pagar umas contas antes que a conta estoure de vez. quando eu virar uma pessoa séria, eu serei minha irmã mana. contas no automatico. organização na caderneta. poupança para a velhice. mas pensando bem, será que eusendominhairmãmana escreveria neste blog? por enquanto, então, continuarei sendo eu mesma. porque gosto deste blog. e gosto da minha vida. embora eu queira um pouquinho do juízo da minha irmã mana e outro pouquinho do da minha irmã maneca. mas eu tenho cá para mim que tenho só a tranquilidade da minha irmã morg. acrescida de uns desvarios da minha mãe. receita nada compatível com o juízo das minhas irmãs mana e maneca. ai ai ai.