quarta-feira, 20 de julho de 2016

domingo



domingo me deu uma vontade grande de chorar. e eu chorei bem alto. mentira. deu vontade de quebrar a televisão. e como não tive coragem de quebrá-la, chorei feito menina. queria apenas ver a final da liga mundial. e a televisão não funcionava. não era exatamente eu. era a pessoa que eu havia sido --- aquela. aquela que acompanhava toda a liga mundial. aquela que vibrava, que roía as unhas, que xingava, que se exasperava a cada jogo de vôlei. pois então. quantos anos!

às vezes, sentimos saudade imensa do que fomos um dia. quem não? e não faz mal. acho que isso que nos faz mais humanos. depois, eu ria solto verbalizando para o Tatupai o que eu estava sentindo naquele momento da vontade de quebrar a televisão. e não sabendo como, chorava feito menina. era impotência diante do não saber fazer. era nada. e era tudo. tanta gente havia ido. kiarostami babenco esterharzi. e um desgraçado que não aprendeu como é soberano amar o outro passou por cima de mais de 80 pessoas com um caminhão. e foi capaz de morrer por isso. como pode como pode? aí, a dor foi ficando grande. e era domingo. e eu aqui, sem meus homens. tenho certeza de que se tivesse quebrado a televisão não teria me arrependido. e depois, entre risos, meio envergonhada, falava para o tatupai que eu podia dar chilique. porque eu quase nunca. e eu acho bem importante não perder esta humanidade. está aqui na vida e nem sempre ela ser fácil. e se permitir chorar. permitir-me. pensar baixinho. ou chorar bem alto até não ouvir. e nisso ver onde mais dói. tocar o próprio corpo. apertá-lo para poder sentir. e ir até às entranhas. enfiar os dedos quentes bem onde eles alcançam. quem não? lembro sempre daquelas manhãs de sábado. parecia que ali eu sabia de tudo, entorpecida pelo sono das longas noites.
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talvez seja isso que ninguém saiba de mim. ou saibam e não consigam alcançar. tenho tão poucas pessoas que me interessam. tenho medo de algumas. tenho amor profundo por outras. tenho respeito imenso por todas. e este é o segredo::: só me importa quem eu amo. manamácia me liga. e eu finjo que posso falar com ela como a pessoa de 40 anos que sou. dou uns conselhos. mas é mentira. porque com ela sou sempre a mesma menina. e há dias que quero ligar para mariamada e contar o que há por aqui. mas tenho por ela tanta admiração que não  teria como dizer dos meus fracassos, embora eu creia que ela saiba --- como o milagre que tem sido nossa amizade desde sempre. tudo. porque nos amamos e nosso amor paira sobre tudo.

acho que as pessoas têm muito medo. eu tenho muitos medos. tenho medo de não ser uma boa mãe. embora todas as manhãs meu filho abra um imenso sorriso quando me vê ao acordar. mas não tenho medo de ter medo. não conheço ninguém que tenha tanta confiança na pessoa que é do que eu. e não conheço ninguém que tenha tanta vontade de mudar certos gestos em si do que eu. confiança e contradição. quem não?

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como nesta foto. chove nas praias de floripa. faz frio. e eu. e eu fotografo meu filho com um guarda-chuva. molhando a roupa que não o protege. e vai protegê-lo menos ainda depois de molhada. mas a foto parece tão bonita. é quase branca. o dia era branco. e hoje me aquece. não precisava mesmo ter medo. a proteção branca estava toda ali.
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1 Palavrinhas:

Mácia disse...

Lindo!
Bjs.