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No fim de semana que passou, eu, o amado e AnaFlor fomos ao show de
Vitor Ramil e Marcos Suzano, lançamento do cd dos dois,
Satolep Sambatow. Suzano dispensa apresentações. Sua percussão, que ficou conhecida pelo pandeiro, e hoje flerta com o eletrônico, é famosa. Suas parcerias dão sempre o que falar. Eu adoro o
Olho de peixe, com Lenine. Já Vitor Ramil é menos conhecido, mas não menos talentoso. Ele é um compositor de primeira. E vem do frio, de Pelotas, no Rio Grande do sul. Desenvolve a estética do frio, como ele denominou o título de seu livro. Sua música, então, nada tem a ver com a “festividade” do verão: é intimista, cheia de imagens surreais. Desde que o ouvi, lembra-me qualquer coisa de cancioneiro. Um homem contando e cantando a nostalgia com uma força poética incrível: as letras são muito poderosas e trazem mesmo esta estética da solidão, um certo modo nostálgico envolvido em mistério; a semântica nunca é exata, transfigurando-se sempre em alguma imagem indefinida, como se a cada objeto, seja pessoa, seja sentimento, seja lugar, fosse dado um outro sentido, um outro lugar. Ainda não posso falar muito. Tenho apenas um dos seus cds: o
Tambong. E ouvi há muito tempo
Longes e
Ramilonga. Foram estes que me fizeram ir ao show. Minha parca memória guardou-os como um momento de pura beleza. O amado depois me disse que a voz dele parece com a de Caetano. Parece mesmo, o que não é demérito, nem mérito. Ramil tem um estilo que é dele, que vem das suas belas letras acompanhadas pela busca da melodia perfeita ou da palavra exata. Vi que ele tem uma paixão por Bob Dylan. E pelos poetas, colocando-os lado a lado da sua poesia. Em
Tambong, tem uma versão de
Gotta serve somebody e, no show, ele cantou
Joquim, que está em outro cd e é uma versão de Joey. Musicou também o belo poema de Paulo Leminski que me me arrepia cada vez que a ouço:
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Desta vez não vai ter neve
como em Petrogrado aquele
dia. O céu vai estar limpo e o
sol brilhando. Você dormindo
e eu sonhando.
**********
Nem casacos nem cossacos como
em Petrogrado aquele dia.
Apenas você nua e eu como nasci.
Eu dormindo e você sonhando.
**********
Não vai mais ter multidões gritando
como em Petrogrado aquele dia.
Silêncio nos dois murmúrios azuis.
Eu e você dormindo e sonhando.
**********
Nunca mais vai ter um dia como em
Petrogrado aquele dia. Nada como um
dia indo atras de outro vindo. Você e eu
sonhando e dormindo.
Ramil está bem acompanhado. Seja pelo parceiro de agora, Suzano; seja por Katia B, que participa do novo disco e cantou no show; seja pelos poetas que lhe acompanham; e pelos músicos também, ele é mais um tesouro da música brasileira. Pena que tão pouco conhecido por estas bandas! Alguns momentos com letras de
Tambong:

Vou andei. E me chegando assim te cercarei.
Digo, aqui tô eu. Que te amo e às tuas pernas quero bem.
...
E tudo isso foi no mês que vem.
Foi quando eu chegar. Foi na hora em que eu te vi. (
Foi no mês que vem)
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Pintei de verde a grama em dia claro.
De verde forte e falso e vivo e raro.
Que seja a grama brutal. Se eu quero a cena ideal (Grama verde)
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As imagens descem como folhas. No chão da sala. Folhas que o luar acende. Folhas que o vento espalha. Eu plantado no alto em mim. (
A ilusão da casa)
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Quarto de não dormir
Sala de não estar
Porta de não abrir
Pátio de sufocar (
Espaço)
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Dia de sair. Ir naquela idéia radical. Tudo o mesmo, nada sendo igual. Tudo pra valer.
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Estrela, estrela. Como ser assim.
Tão só. Tão só. E nunca sofrer.