quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Os titãs e os berros

Com tantos cds é natural que muitos deixem de ser ouvidos. Quem consome bens culturais, não deixa de ter a voracidade de outros tipos de consumidores. Às vezes, a avidez pela novidade é apenas isto: avidez, enquanto aquele velho cd, ou livro, ou filme, estão ali esperando para serem de novo "contemplados". Nestes dias, eu tenho me dado ao luxo da revisitação, ouvindo cds antigos, assistindo a filmes que havia comprado e ainda não havia assistido e lendo alguns livros. Enfim, tornando viva matéria morta. E hoje, por conta da visita do Bozoca (preciso escrever sobre esta figura!) que apareceu sábado no exato instante em que eu resolvia ver um filme que o deixou estarrecido, melancólico e ainda mais cáustico do que já é, amanheci ouvindo Titãs - fase Arnaldo Antunes. E como eram bons os Titãs! Nada a ver com a cópia em que se transformaram. Os cds ouvidos foram Jesus não tem dentes no país dos banguelas e Õ blesq blom, que dispensam apresentações para quem era fã da banda. Embora eu tenha grande admiração pela trajetória do Arnaldo Antunes - fã de babar mesmo, de comprar tudo, desde os livros até os cds -, ouvindo estes cds eu fico com saudade do Arnaldo que não existe mais. Sinto saudade do berro, do ruído, da boca suja (ok, boca suja ele ainda tem, mas o tom visceral, próximo do grito, faz falta), como quando Os Titãs berram, bem próximo da oralidade: Todo mundo quer amor/ Todo mundo quer amor de verdade/ ... Quem tem pinto saco boca cu buceta quer amor/ Ele quer/ Ela quer.

Sim, sim, o mundo precisa deste tipo de berro vindo da arte, deste choque, desta estocada nos bons costumes, nas palavras comedidas. É preciso sentir o pulso pulsar bem forte, deixar-se contaminar pelo nosso lado mais cão, porque ele existe. E isto não significa deixar de ser gentil, de ter cuidado conosco e com o outro, significa ser menos ascéptico, saber gritar quando o outro grita, saber se lambuzar de doce ou de porra ou de porre e nem por isso duvidar que se é cumpridor do seu cartão de crédito a vencer. Isto me faz lembrar de outra música que diz: "Não preciso ser alguém,/ eu consigo viver sem/ armas pra lutar." E enquanto ouço, penso que meu intento sempre foi este: desarmar-se. Viver armado é a maior merda que se pode fazer com a própria vida - como são tristes pessoas que não param nunca de pensar que existe um batalhão pronto para devorar seus rabos. Deveriam ouvir mais música, ler mais livros, ver mais filmes, deveriam querer "inteiro e não pela metade" , deveriam vez ou outra experimentarem a delicadeza de um instante porrada ao som dos Titãs.
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Talvez seja Bozoca que esteja me fazendo lembrar, talvez sejam os Titãs, ou talvez eu seja assim mesmo, sempre tenha sido, embora ponha reparo para não dar muito na vista.

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4 Palavrinhas:

Cristina Soares disse...

Kkkkk. (aplausos de pé, encima da cadeira !!!). Adoreiiiiii !!! Eu quero inteiro e não pela metade... E esse batalhão dos rabos rsrsrs ???? Vão se fu... Beijos, miga !!!!

Anônimo disse...

IHHHH, mas eu sempre acho que tem "um batalhão pronto para devorar o meu rabo ...hehehehe...

Considero Õ BLesq bom e Titanomaquia (este último, já sem Arnaldo Antunes) os dois melhores discos do Titãs.

E você tem toda a razão: como a banda era ótima!

E quem será esse Bozoca????

Um abraço.

renata penna disse...

me enxerguei em cada palavra. também vivo sem armas. e é bom, tão bom.
bjo, flor.

Passageira disse...

Meu intento tb sempre foi e será: desarmar. A mim a qtos eu conseguir. Pra isso, é bom ouvir Titãs comer Arnaldo Antunes sim. E ler Milena ouvindo porrada! rs...
Beijo!!