terça-feira, 7 de julho de 2009

ossos ocos do oficio

quatro livros começados. nenhum avançando de fato. final de semestre é um estupro para todo professor que se preze. é. há muitos que não se prezam. estes devem ser mais felizes. uma ideia quase romântica me persegue: a de que posso ainda ser a diferença para quem quiser. algum aluno ou alguma aluna com vontade suficiente para ter brilho nos olhos. quantos? três ou quatro com alguma sorte. dias e dias, horas e horas, lendo textos e sentindo na carne a inutilidade do gesto. como alcançar o outro? às vezes me indigno. às vezes me envergonho com o que leio. e agora, com uma barriga de seis meses, me vem pensamentos tresloucados, do tipo: e se ao invés de entregar meu filho a um professor que não sabe fazer uma frase com sentido eu mesma o ensinasse? haha! quero voltar a quantos séculos? quando estou menos umbigo, imagino um trabalho, uma tutoria, um curso específico de produção de texto, algo como parar de ignorar que a situação não nos atinge frontalmente - 4 anos o aluno no curso de Letras e sai sem saber o que diabo é análise literária ou, pior, o que é uma frase com sujeito, predicado e verbo, e que, sei lá, não repita a mesma palavra dez vezes em cinco linhas. ninguém sai querendo estrangular a gramática, simplesmente porque não sabe o que é estrangulamento, o que é certo ou errado. faltam imaginação, audácia, relação conflituosa e bela com o mundo das letras. uma monografiazinha de final de curso, 30 páginas no máximo, pouco maior que um artigo, e na hora de orientar aquela indignação ou aquele silêncio envergonhado. o que é isto?

sim, vivendo há muito mais de um mês única e exclusivamente para a universidade e para este tipo de trabalho infame, hoje estou cansada demais. descrente demais. quero ler meus livros. beijar muito na boca com este barrigão enorme. ver meus filmes. ou simplesmente dormir até acordar sem sentir sono algum. ao invés disso, eu passo mais uma tarde, mais uma noite, corrigindo textos, escrevendo anotações e lembretes nas bordas. e o pior: no fundo, eu sei, tenho certeza, que a maioria não vai dar atenção alguma ou, na melhor das hipóteses, não vai saber o que fazer.

chega.
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7 Palavrinhas:

Anônimo disse...

Milena, há alguns anos, em conversas com minhas irmãs - ambas professoras da educação básica - e com amigos (parte deles também educadores), cheguei a uma conclusão: o despreparo de um bando de estudantes e o calamitoso ambiente de aprendizagem do ensino fundamental e do ensino médio iam acabar desaguando, mais cedo ou mais tarde, no ensino superior. Parece que foi mais cedo.

Você fala em fazer a diferença. Esse é o único alento que resta a milhares de professores e o que faz com que eles se sintam suficientemente motivados para levantarem-se da cama. Se você carrega esse desejo, continue na lida.

Mas deixo um conselho (e como você sabe, se conselho fosse bom... etc, etc., etc....): vá ler seus livros, dormir até tarde, ficar perto das pessoas de sua afeição. É muito mais saudável e recompensador..

Estamos emburrecendo. Celeremente.

Unknown disse...

Bão. É nosso papel mudar ao menos uma parte disso.

Muito cedo pra desanimar, minha amiga. A gente pode fazer diferença. Tou a um certo tempo nesse range rede e sei que dá pra fazer diferença. Não muito, mas alguma coisa dá. Vocês das letras, que educam educadores, eu sei, têm uma responsabilidade e um peso maior. Mas é de dentro dos intestinos do monstro que podemos matá-lo. Lá no meio do cerrado no fim do mundo ou no meio do pântano abafado.

Não dá pra ficar acomodado num convencional "estou fazendo a minha parte", não estou dizendo isso. Estou dizendo outra coisa, a gente pode intervir, de verdade...Leva tempo, tem que ter muito estômago, mas é assim mesmo. Temos o poder de construir coisas que podem, de verdade, ficar. Sem ilusões, pois, como dizia aquele meu amigo de Gravata Borboleta que encarnava um Jagunço Poético, "Quem mói no asp'ro não fantasêia", a gente precisa usar nosso gosto de especular idéia e contaminar uns quantos...Faz diferença, eu sei, já fiz alguma e foi muito bom.

Pra ficar ainda um pouquinho mais piegas tem aquela frase do Talmud que o Spielberg usou (incompleta) naquele filme:

"Aquele que destrói uma alma é como se destruísse o mundo todo. E aquele que salva uma vida, é como se salvasse o mundo todo"

(Desculpe a meia pieguice)

Ilaine disse...

Milena!

Você, com certeza, faz a diferença, pois és especial. Seus alunos terão o brilho de tua sensibilidade e de teu entusiasmo nos olhos. Levarão no alforje a tua paixão pelas coisas e também os teus sonhos. Ao ler teu texto, lembrei-me de minha irmã que é professora na Feevale, no RS e num e-mail recente, falou-me algo muito paracido. Também ela está preocupada com os professores que no futuro irão lecionar para os filhos dela.

Gravidez! Que maravilhoso, menina.
Curta o máximo.

Fique bem!

Adicionei seu blog aos meus favoritos.

Abraço

http://diretoparaoaltar.arteblog.com.br disse...

Querida Milena,
Qu bom que vc curtiu o meu blog "diretoparaoaltar".Dei uma passada hoje no seu espaço e também gostei muito, parece que temos algumas afinidades, entre elas, o mesmo signo e o amor pelas letras.Além , claro, de um forte senso de urgencia em contribuir para um ambiente melhor dentro do nosso microcosmo.Não desanime, a sua luta é a sua luta, a do outro pertence a ele. Neste hiato, as coisas sempre fluem para quem está vivendo o "bom combate" e na maioria das vezes travam pra quem se acomoda.Bem, é isto! Um abraço com as melhores energias ressonando para o barrigão...
Ana

Anônimo disse...

fruto do cansaço,compreensivel.mas tenha a certeza de contagiar,pois o brilho sempre rompe a escuridão é só ter um lampejo,e estamos relampejando a sua volta.eu pensei como vc um dia e veja fiz dois apaixonados pela literatura e nunca precisei força-los a ler.as coisas acontecem ,vamos dando exemplo,coragem,bjks

vovó ziza disse...

palavras de vovó,no comentário acima,só esqueci como se coloca o nome,compreensível tb,coisas de vovó bjks

Olga de Mello disse...

Milena,
Professores fazem sempre a diferença. 'Diário de Escola', do Daniel Pennac, mostra bem isso. Se hoje ele é professor, foi um péssimo aluno, daqueles que ninguém pensa que conseguirá chegar ao fim do Ensino Fundamental. Dois professores se empenharam para transformá-lo em estudante. Mudaram a vida dele.
Nem todos têm tais professores, nem todos têm dificuldades. Mas algum de seus alunos estará sendo mexido, lá no fundo, por você. Mesmo q não demonstrem.
E quando a gente está gestando, todas as dúvidas da Humanidade passam por dentro da gente. Até que alcançamos a plenitude da criação. Beijo em vc e no Poeminha.