quinta-feira, 2 de julho de 2009

pina bausch partiu

pina bausch está aqui em mim, como tudo que me atravessa de forma perfurante. passo todos os dias diante de sua imagem de braços estirados dançando uma dança que desconhecíamos até que ela nos apresentasse. ela está no meio dos meus cds, entre a música que ela amou por toda a vida, porque não se pode amar a dança sem amar também a música. ela está também no livro que se recusa ir para a estante e permanece deitado na mesinha da sala, sempre pronto para ser folheado. e está, sobretudo, em minha memória.

madruguei duas manhãs na fria paris para comprar o ingresso de bandoneon. raridade. insone, dormia sempre até mais tarde. mas a razão era compensadora. eu queria ver aquela mulher que havia me fascinado na abertura do filme fale com ela, de pedro almodovar. e que, por isso, eu havia assistido aos seus vídeos de dança um depois do outro no Pompidou. quando prorroguei minha partida sobretudo para assistir ao seu espetáculo, sequer pensei que a noite da dança também seria a noite da despedida do ano intenso. foi vendo os dançarinos de pina bausch que senti a dor intensa da saudade do que ainda tinha ali e, no entanto, já havia perdido. no thêatre de la ville, os dançarinos de bausch, indiferentes a minha dor, exasperavam a plateia com a mobilidade, a teatralidade, a visceralidade da sua dança, enquanto eu tentava recompor uma inteireza ora perdida. bandoneon cortou com navalha os meus pulsos. e depois os raios da lua refletidos no Sena queimaram minhas pupilas das muitas lágrimas.

onde estaria pina bausch além de na minha memória? foi o que nunca deixei de me perguntar até então. eu sonhava em ver ao menos mais uma de suas danças, afinal todos os anos ela tinha programação marcada na fria cidade. imaginava uma viagem que coincidisse. mas a morte é esta suspensão. este definitivo adeus.

+ Pina Bausch, uma das maiores coreógrafas de dança contemporânea, partiu aos 68 anos, no dia 30 de junho, depois de ter revolucionado o conceito de dança.
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4 Palavrinhas:

vovó ziza disse...

inveja de vc,nunca vi e verei nada com a mesma poesia sua.mas pina continuara´dançando se tiver sua arte descrita da maneira que vc faz,paixaõ e ternura ,fico com a imaginação que vc despertou,bjs

Roy Frenkiel disse...

Escreves muito bem, Milena, adorei. Vejo seus comentarios na casa do Halem e hoje resolvi segui-la. Sou ignorante no que diz respeito a danca ou qualquer outra forma de arte teatral ou plastica, mas por suas palavras entendo o quanto ela significava pra ti.

forca!

bjx

RF

Ilaine disse...

Querida Milena!

Vim agradecer pela viista lá no Ensaios. Fiquei imensamente feliz. Espero que tenhas gostado.

Adorei o teu texto. Ah, como escreves bem.

Milena, eu também tive a oportunidade de ver uma coreografia de Pina Bausch em Wuppertal. Fascinante! Pois, que grande perda, não é?

Abraço, com carinho

Diego Viana disse...

Foi lamentável. Cinco dias depois de saber que estava doente. Pior é que perdi duas vezes a oportunidade de vê-la nos últimos dois anos e nunca vou me perdoar por isso!