sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Maus, de Art Spiegelman


Eu não li Primo Levi. Nem Hannah Arendt. Tenho muita vontade. Mas nunca dá para ler tudo que quero. Muitos acabam ficando para um depois que demora. Mas leio Marcio Seligmann-Silva e Jeanne-Marie Gagnebin - e sempre repito: junto com Marcos Siscar, quando os leio, penso: "quando crescer, quero ser como eles". Porque eles são fodas! Além  da inteligência fora de medida, escrevem muito bem. E Seligmann e Gagnebin, professores da Unicamp, têm um trabalho sobre a memória que bebe na fonte de Levi, de Arendt, de Benjamin - a memória do holocausto. Sempre a vontade de me aprofundar mais. E por que não o faço, além da falta de tempo? Porque virou moda. Hoje, na universidade, todo mundo quer falar sobre memória, sobre o holocausto - e haja repetição, diluição...  o horror!

Maus, de Art Spiegelman, que trata sobre estas questões, caiu de pára-quedas nas minhas leituras, cada vez mais aleatórias. Daqueles impulsos  que só fazem bem.  Maus é uma porrada, seja qual for a linha que se segue, seja qual for a moda. Perfurou-me profundamente. E é uma HQ! Está tudo ali.  A estrutura narrativa é muito simples - e também está na moda - mas é, como já disse, uma porrada: não há um herói. Os judeus não são heróis. O sobrevivente, menos ainda. Pelo contrário, um velho ranzinza e pão duro ao extremo - a exposição da caricatura, que se dilui como caricatura. Eu ri e chorei. E li para meu filho. E vou colocar na sua prateleira, torcendo para que um dia ele o leia.

Reconstituir a memória de um outro, no fundo, é dar-lhe um lugar no mundo, na história. É o que faz o Art, autor e narrador. Mas o que ele busca é, antes, a História. E não a história do pai. Mas apreender a História é estar disposto a enfrentar as cinzas daquilo que foi. É saber que não estava lá - e que isso faz toda a diferença, sobretudo quando se deveria ser o herdeiro daquele que lá esteve. Art explora isto - a própria história, a história do pai, a história da História, fazendo assim um relato memorável, perfurante, assustador.
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2 Palavrinhas:

Anônimo disse...

Ai, Milena fico com vergonha: achei Seligmann-Silva tão difícil! Acho que foi pela imensa quantidade de referências presentes no seu texto. E isso não é um problema: afinal, é um intelectual dialogando com outros intelectuais. Mas me senti imensamente pequenininho, hehehe...
Ah, pra compensar, posso dizer que já li Hannah Arendt (no pouco tempo em que cursei Ciências Sociais).

Não conheço esse trabalho do Art Spiegelman; vou procurar com um amigo meu aqui de BH que está por dentro de tudo na área dos quadrinhos. Inté.

P. S. Estou lendo As brasas (brevemente, comentarei no blog)

Neuza disse...

Quando descobri Maus fiquei fascinada e li mais de uma vez. Fui atrás de outros albuns do Spiegelman e descobri um outro muito interessante sobre NY e 11 de setembro. Ele ressucitava personagens dos comix antigos, do começo do século revolvidos nos escombros. Mas pegar a própria história pelo rabo tem muito mais poder e até hoje Maus é meu preferido. Hoje também descobri que você virou mãe! Que legal! Quanta mudança desde que entramos em contato e vc estava na França! Um grande beijo pra vc e filhote.