terça-feira, 9 de junho de 2009

A cidade ilhada, de Milton Hatoum

Demorei a saber o porquê do desencanto com Milton Hatoum. Um desencanto paulatino, como se o fato de ter "descoberto" esse escritor desde o seu primeiro livro me fizesse protelar o seu enterro simbólico. Simbólico, claro, pois como me lembrou um amigo, há tempos a crítica o elegeu um "grande escritor". E uma vez dado o título, dada a preguiça e o compadrismo da crítica tupiniquim, impossível destronar a majestade.

A cidade ilhada, seu último livro, a meu ver, não chega mesmo a ser mediano. Talvez a publicação seja por razões contratuais, afinal é a reunião de contos escritos em ocasiões diversas, o que me leva a pensar nos malefícios da profissionalização do escritor, mas não é por aí que quero me enveredar. Há livros maravilhosos escritos em situações adversas (lembrar de Dostoiévski é apenas o exemplo mais fácil). Não falta unidade no livro de Hatoum. Talvez o problema seja justamente este. Composto por 14 contos, o que vemos é um painel de personagens que transitam em ambientes bem demarcados; porém, enquanto a ambientação é primorosa, as personagens não têm densidade psicológica, beirando à caricatura: é um velho contador de histórias`competindo com a televisão, um velho japonês que por ter dado um passeio de barco com uma professora quer que ela jogue as suas cinzas no rio Amazonas, é um pesquisador que no estrangeiro descobre uma carta de Euclides da Cunha - os enredos são frágeis, sem uma problematização que justifique as suas existências.

E reside aí a minha decepção: Hatoum escolheu a ambientação em vez da construção das personagens. Sua escolha recai sobre uma Manaus do passado, que, segundo seus enredos óbvios, deve ser historicizada para não cair no esquecimento. É uma nostalgia que tenta retratar uma aura que provavelmente nunca existiu. Quem leu Relato de um certo oriente ou Dois irmãos, seus dois primeiros livros, sente o uso forçado de algumas palavras que servem tão-somente para demarcar o ambiente: palavras do cotidiano deste outro lugar, desta outra gente - região típica à margem. Ou seja: ele trocou a literatura pela ideia de cultura e com isso fez uma péssima escolha. Já não me convence mais.
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1 Palavrinhas:

renata penna disse...

só li Dois Irmãos. Gostei, mas nada arrebatador. esse, acho q nem vou me dar o trabalho...
a barriguinha, como vai?