terça-feira, 19 de agosto de 2008

Este Bernardo Carvalho...


Desde que comecei a escrever em blog – bah, já vai fazer cinco anos – eu optei por não escrever sobre os “livros teóricos” que eu lia. Era o início do doutorado e eu sabia que teria de ler muitos livros desse tipo. Eles não entram nem na minha lista: ponho ali apenas o que leio para-além da obrigação. Porém terminei de ler um livro de crítica do escritor Bernardo Carvalho [que é romancista e escreveu, entre outros, Nove Noites, Mongólia, As inicias etc.] e senti vontade de comentar sobre esta leitura. O livro chama-se O mundo fora dos eixos [crônicas, resenhas e ficções] e é uma reunião de seus textos publicados na Folha de São Paulo desde 1995.

Bernardo não é daqueles ensaístas brilhantes que ficamos embasbacados devido à linguagem, mas tem muita sacada bacana; sabido, sabido...! Senti um incômodo e um prazer intenso ao lê-lo. O incômodo e o prazer vieram da enorme variedade de seus interesses. Ele não se restringe aos livros, mas discorre também sobre cinema, artes plásticas, viagens. Sua maior preocupação – ou pode ter sido a seleção feita por Arthur Netrovski que faz pensar assim – é localizar o estatuto da arte na contemporaneidade. E neste sentido é muito interessante, porque ele nem é daqueles integrados, que acreditam que tudo está nos eixos, mas também não é um apocalíptico, que acha que o “fora dos eixos” é uma desordem absoluta. Ele se interessa enormemente pela arte de seu tempo. Dá para sentir que escrevia os textos “pegando” o que lhe estava à mão naquele momento; e este estar à mão mostra uma pessoa irrequieta, atenta para o que acontece não apenas no Brasil, mas também no mundo. E como viaja este Bernardo: Japão, Nova Iorque, Paris, Acre... e por aí vai! Mordi-me de inveja.

Longe de ter o seu conhecimento e a sua sensibilidade, eu tenho que confessar que me identifiquei com ele, e por isso me incomodei – e ao mesmo tempo me redimi. Eu sempre penso que deveria ser mais focada; que deveria como professora de literatura brasileira me focar mais na história e na própria literatura brasileira. Por que diabos eu me interesso tanto por saber o que ainda não sei e quero assistir a tantos filmes, a tantas peças de teatro, ouvir tanta música? Tudo MUITO. Por que, neste momento, estou lendo Artaud e Bernardo, quando deveria ler mais Machado de Assis e Padre Antonio Vieira, ja que é sobre eles que tenho de dar aula? Por que, jesuscristinho, eu não me contento com um cadinho de cada coisa? Por que eu varo as madrugadas assistindo a Filme de amor, do Bressane e 10 on ten, de Kiarostami, enquanto bebo uma cerveja depois da outra até me sentir tonta e começar a escrever palavras carregadas das minhas dores, juntando-as com as dores do que acabei de ver e ler?

Eu não sei por que sou assim, mas confesso que me senti aliviada ao ler alguém que se parece comigo (repito: não estou me comparando, estou me identificando, porque ele é zilhões de vezes mais sabido do que eu). Não sei se Bernardo bebe cerveja (se um dia vê-lo em alguma palestra, hei de perguntar), mas agora sei que ele perde muito tempo com todas estas inutilidades: cinema, literatura, artes plásticas. Assim como eu também perco. Então, se ele é assim e ainda escreve aqueles romances fodidos de bons (eu reclamei de Nove Noites, mas é porque sou enjoada), acho que vou continuar sendo como eu sou. Afinal, embora me dê chicotadas de vez em quando rogando por mais foco e concentração, eu gosto muito de meus variados interesses :)

Bem, mas agora que terminei o livro deste fofo e escrevi aqui no blog, vou ali ler uns sermões do Padre, porque é sobre ele que amanhã tenho que falar para 30 alunos!

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