terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Goya e Sombras de Goya

Nestes dias, vi dois filmes sobre Goya. Os dois, belíssimos. Impressionante como dois filmes tão diferentes conseguem dizer tanto de um homem – ou do imaginário que cerca este homem. O primeiro dispensa apresentação: Goya, de Carlos Saura, saído em 2001. Um Goya velho, de 82 anos, confessa para a filha os acontecimentos da sua vida. Conta as perdas e os erros da juventude sem, no entanto, se lamentar de fato. Para mostrar o homem dividido, Saura escolhe uma luz muito próxima da dos quadros de Goya, sobretudo as da sua fase negra. As primeiras cenas são de tirar o fôlego; e o que se segue é uma belíssima mostra de como Saura entremeia imagens e sons para fazer o espectador se sentir na própria obra de Goya. Por vezes o cenário é quase um teatro com sua luz vermelha; um ambiente onírico que nos leva à angustia da rememoração com delicadeza no que ela tem de brutalidade.

O outro, Sombras de Goya (2006), é de outro mestre: Milos Forman. Totalmente diferente do Goya de Saura! Mais focado na história de determinado período da vida de Goya do que na sua vida propriamente dita, o filme mostra os impasses de um homem diante da crueza da história. Parece que se pergunta o tempo todo qual a responsabilidade do homem diante das atrocidades da história. E não há uma resposta certa. Forman entende da ambigüidade e aqui entende ainda mais daquela que parece ter constituído o pintor. É verdade que, se comparado com o Goya de Saura, Sombras perde um pouco do seu brilho, e mesmo assim é um belo filme!

Vi os dois filmes com muita emoção. Vieram-me ainda uma vez todas as sensações de quando percorri as salas dedicadas a Goya no Museu do Prado. Lembro que saí tão mortificada que foi difícil reconhecer outro Goya senão aquele encoberto de negro. Eu conhecia apenas o Goya “oficial”: As duas majas, o 3 de maio em Madri... Foi no Prado que vi o avesso do artista: as suas pinturas negras. De onde veio este avesso? Que homem era este que pintava tanto as brincadeiras dos príncipes como os espasmos da morte, do fantasma, do gigante? É como se ele tivesse sido dois homens; um aberto às benesses da corte e outro atormentado pelos fantasmas da história. Reencontrei este Goya nos dois filmes, apesar das diferenças, e veio daí a emoção.
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5 Palavrinhas:

Anônimo disse...

Milena,

Tuas resenhas me deixaram com água na boca: tentarei ver esses dois filmes urgentemente. E os dois diretores são dos meus preferidos!


"Edson, tenho um tanto a concordar contigo e outro tanto que resiste. Sinto que este é o melhor jeito de chegar mais perto das suas idéias, que pedem aceitação e resistência ao mesmo tempo!"

Posso usar isto que você deixou nos comentários (num texto que estou escrevendo sobre blogs)?
Com citação da fonte, é claro.

Abraços, flores, estrelas...

Cristina Soares disse...

Oi, Milena ! primeira vez aqui no seu blog. Já vi que tem profundidade por aqui (rs). Gostei ! Um abraço !

Unknown disse...

Mile de mio cuore! Legal o blog novo! Eu adorei a foto da Cara limpando o mar no MAC. BACANA!

Venho aqui com um comentário mais "apropriado" outro dia...ehehehe.

Agora, tempo de dar conta da agenda que ficou atrasada...eita coisa...um dia vou ser vagabundo..é meu sonho de consumo!

Beijos bronzeados.

Rivero

Anônimo disse...

Ai, Milena, que vergonha! Não tenho muita intimidade com artes plásticas (cinema, então, nem falar). Mas não há como não se entusiasmar com suas ótimas postagens sobre filmes, que nos convidam sempre a vê-los. O Milos Forman dirigiu um dos filmes de que mais gosto, o musical Hair.

Quanto ao conceito do que vem a ser pós-modernidade, devo confessar que escrevi essa postagem pensando justamente na sua "reação" (rs). Assim poderia usufruir dos seus conhecimentos e dar uma injeção de inteligência lá no meu blog (já que ele estava precisando). Valeu. Continuemos o debate?

renata penna disse...

opa, indicação de bom cinema, anotado! não vi nenhum dos dois ainda, mas já foram pra lista! ;O)