domingo, 25 de janeiro de 2009

O cronópio Julio Cortázar e outros cronópios

Estas frases abaixo são do voltume 1 de A volta ao dia em 80 mundos, dois livrinhos geniais de Julio Cortazar, indicação que eu fisguei nos dias maravilhosos que passei na casa da Dêamada, em São José do Rio Preto - aquele tipo de cidade que amo porque amo algumas pessoas que lá habitam. Devido à fisgada, eu li também os dois volumes de Último round, que têm a mesma estrutura. Se estes livros não tivessem sido publicados há mais de 40 anos, com certeza teriam sido, antes, blogs. Suas estruturas anti-estruturas, que aceitam como oferendas todas a sorte de colagens, são pequenas máquinas de invenção, criatividade, humor, ironia, ternura, etc. etc. etc. Cabe muito nestes etc.: poemas, ensaios, contos, notícias, desnotícias, fotografias do Cortazar e de outros, desenhos ... A ideia parece ter sido registrar tudo que lhe interessava, como um grande caldeirão onde se faz uma sopa com todos os restos da geladeira. E quem já leu qualquer outro livro deste escritor deve saber o quanto ele é genial (de fato, este é um adjetivo que se pode abusar ao nos referirmos a ele). Para mim, Todos os fogos, o fogo é um dos melhores livros de conto de toda a literatura. E O jogo da amarelinha é daqueles livros que esticam ao máximo qualquer conceito de literatura. Porém, deixemos de conversa, e vamos às frases, não sem antes confessar de que eu adoraria tê-las inventado e que elas pudessem representar o que, para mim, é este "Nenhum lugar":

"Tudo que vem a seguir participa o máximo possível (nem sempre se pode largar um caranguejo cotidiano de cinqüenta anos) dessa respiração de esponja em que continuamente entram e saem peixes de lembrança, alianças fulminantes de tempos e estados e matérias que a seriedade, uma senhora ouvida em excesso, consideraria inconciliáveis. Eu me divirto pensando neste livro e em alguns de seus previsíveis efeitos na referida senhora, um pouco como o cronópio Man Ray pensava em seu ferro de engomar cheio de pregos e outros estupendos objetos quando afirmou: "De maneira nenhuma eles deviam ser confundidos com as pretensões estéticas ou o virtuosismo plástico que em geral se espera das obras de arte. Naturalmente - acrescentava a corujinha de óculos pensando na tal senhora -, os visitantes da minha exposição ficavam perplexos e não se atreviam a divertir-se, porue uma galeria de pintura é considerada um santuário onde não se brinca com a arte".

Tem mais:

"Já se deve ter notado que aqui chovem citações, e isto não é nada perto do que vem pela frente, ou seja, quase tudo. Nos oitenta mundos da minha volta ao dia há portos, hotéis e camas para os cronópios, e além disso citar é citar-se, como ja disseram e fizeram mais de meia dúzia, com a diferença de que os pedantes citam porque veste bem e os cronópios porque são terrivelmente egoístas e querem monopolizar seus amigos..."

E como falei da Dêamada, vale uma explicação: ela não se conforma de que eu não tenha lido ainda Histórias de cronópios e de famas, porque ela diz que eu sou um cronópio. E me chama de Cronopinha, quando eu lhe digo algo que parece uma travessura, mas eu estou começando a ter certeza de que ela é a verdadeira cronópia; esta moça que não gosta de claridade e que, por causa disso,quando estou lá, vem se arrastando com os olhos fechados e os braços esticados até a "minha" janela para fechá-la. Só depois disto, ela se senta na beira da cama e iniciamos ali nossas conversas infindaveis, para horror da Djoia, que morre de ciúmes e fica latindo a nossa volta.
Categories:

0 Palavrinhas: